segunda-feira, 10 de março de 2008

Dezembros

Casar-se, moldar-se e parir
Esquecer de si
Esquecer da arte, da parte crítica e política do sim
Ela paria e se diminuía ... cada dia mais;
Em cada filho seu tempo de se expressar era sorvido, substituído,
Corrompido por esta função, cravada na alma com conceitos de outrem.
Estupravam sua mente, sua arte eloqüente,
Negada, estagnada...,morta e cética...
Se ao menos a deixassem pintar, criar (além de filhos), cantar... compor-se.
Seus olhos foram ficando cinza! E no seu sétimo filho sua esperança era menor
Que sua capacidade de educar, proteger...amar
Já não era tão vaidosa em seus trinta quilos extras;
Sandálias havaianas nos pés, calcanhares rachados e cansados de carregar os outros.
E agora! Como poderá ser ela, mãe? Ser algo.. coisa qualquer... mulher!?
O quê será de nós, seus paridos, seus famintos de presença? O quê será?
Vez ou outra aquela nuvem pesada saía de seus olhos;
Então ela sorvia um pouco de decência, oxigênio, ego do charque.
Aí ela cantava... sempre canções antigas (do tempo em que era viva),
Depois sorria e vinha buscar seus rebentos.
Como era triste ter consciência de sua morte, de sua sorte, da arte esquecida;
De seus anseios sugados dos seios pelos seus filhos... Seios murchos,
Tão murchos quanto a tentativa que fez de ser feliz!

Autoria: Luce'lia Martins -2004

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